Prescrição Tributária III

O tema do prazo prescricional para o sujeito passivo tributário pleitear a devolução de tributo recolhido com fundamento em lei posteriormente declarada inválida pelo Poder Judiciário, atualmente, tende a uma estabilização nos Tribunais Administrativos e Judiciários, pelo menos no que tange a tributos federais.

A Jurisprudência vem consolidando o entendimento segundo o qual o prazo do contribuinte pleitear a devolução de tributo indevido (quando a causa da restituição for a invalidade da lei que obrigava o recolhimento) somente se inicia com o reconhecimento definitivo de tal invalidade (pelo Poder Judiciário ou pela própria Administração Tributária).

Segundo esta linha de entendimento, a sistemática de recolhimento do tributo, ou a modalidade de lançamento tributário a que o mesmo se submete, é irrelevante para efeito de definição do termo inicial do prazo prescricional para o pleito de devolução do tributo indevido.

Ocorre que recentemente o Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 416352), em voto do eminente Ministro José Delgado, parece inaugurar uma nova interpretação para o tema, ao entender que “o prazo de 5 (cinco) anos, em caso de lei declarada inconstitucional, não se aplica quando há lançamento tributário por homologação. Nesse caso, há de prevalecer a data do fato gerador e o momento em que o lançamento foi tido como homologado, em face da omissão do fisco.”

Este entendimento a meu juízo, com o devido respeito que merece aquela Corte Superior, representa um retrocesso na evolução jurisprudencial acerca do tema.

Primeiro. Este entendimento do Superior Tribunal de Justiça se apóia na confusão, na qual incorre também parcela da Doutrina (a despeito da posição clara do Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda), entre prazo para o exercício do direito de requerer a devolução do indébito tributário e prazo alcançado pelo direito requerido.

O prazo de cinco anos a se iniciar com a pronúncia definitiva da invalidade do recolhimento tributário (data do ato ou fato da qual se origina o direito, a teor do Decreto nº 20.910/32) consubstancia um prazo prescricional, isto é, prazo para o exercício do direito ao pleito de devolução (perante o Poder Judiciário ou diante da própria Administração Tributária).

Logo, definido que o recolhimento do tributo foi indevido, tem o sujeito passivo tributário cinco anos para pleitear a devolução do mesmo. Quais os recolhimentos que podem ser objeto de tal pleito? Resposta: todos aqueles que se fundaram na lei declarada inválida pelo Poder Judiciário, sem limitação de prazo, por natural decorrência da teoria de nulidade dos atos contra legem ou contra constitutionis presente em nosso ordenamento jurídico.

Neste sentido, embora o contribuinte lesado tenha apenas cinco anos para exercer o direito de pleitear a devolução do tributo declarado indevido, a contar desta declaração (prazo de prescrição), os recolhimentos abrangidos por este pleito, isto é, o objeto do mesmo, encontra limite no prazo de validade e eficácia da lei tributária declarada inválida. Em uma palavra: todos os recolhimentos efetuados sob a eficácia da lei tributária inválida podem ser objeto do requerimento de devolução.

Assim sendo, o ordenamento jurídico estabelece prazo para o exercício do pleito de devolução de tributo declarado com base em lei posteriormente declarada inválida (prazo prescricional de cinco anos previsto no Decreto 20.910/32), mas o alcance de tal pleito deve ser definido a partir da teoria da nulidade dos atos normativos contra legem (em sentido lato), razão pela qual todos os atos jurídicos (recolhimentos) praticados com fundamento na norma inválida devem ser revistos (no caso, através da devolução do indébito).

Segundo. Aquela decisão do Superior Tribunal de Justiça retrocede também na medida em que apóia a definição do prazo prescricional na modalidade de lançamento tributário a que se submete o tributo declarado inválido, desconsiderando a evolução jurisprudencial segundo a qual o recolhimento indevido, porque fundado em lei inconstitucional, sequer é regulado pelo Código Tributário Nacional, devendo o prazo prescricional que regula a sua devolução ser encontrado na norma geral que disciplina as ações contra o Poder Público (Decreto 20.910/32).

Vale dizer, recolhimento tributário exigido com base em lei inválida, por consubstanciar autêntico ato ilícito praticado pelo Estado deve ser por este reparado (através da devolução do indébito), independentemente da forma através do qual o mesmo se operacionalizou. Em outras palavras, a modalidade de lançamento de tributo considerado inválido não altera a sua natureza de ato ilícito para efeito de definição do prazo prescricional da devolução do mesmo.

Portanto, se o Superior Tribunal de Justiça em futuras decisões repetir o entendimento manifestado na decisão supra citada teremos uma nova alteração na Jurisprudência acerca do tema “prescrição do pleito de devolução do indébito efetuado com base em lei tributária declarada inválida”, a qual, a meu ver, representará um retrocesso na evolução da questão.