ICMS monofásico e os regimes especiais

** Texto publicado no jornal O Liberal em 27.09.16

Como regra geral, o ICMS é imposto plurifásico, apoiado na técnica da não- cumulatividade, compensando-se os créditos gerados em uma operação com os débitos da operação subsequente.

No entanto, podem os Estados, no âmbito da sua competência constitucional para regular o tributo, prever incidências monofásicas do ICMS, tais como a substituição tributária interna e os regimes fiscais especiais como os centros de distribuição?

A não-cumulatividade constitucional constitui uma técnica de tributação que objetiva distribuir a carga tributária incidente sobre mercadorias e serviços nas diferentes etapas do processo produtivo, impedindo através da sistemática de créditos e débitos que o ônus fiscal recaia apenas sobre um agente econômico.

Através da técnica da não-cumulatividade tributária, o ônus fiscal do ICMS é distribuído na cadeia econômica e incorporado economicamente ao preço das mercadorias e serviços negociados que, ao fim e ao cabo, é transferido ao consumidor final.

Por outro lado, por estar prevista na Constituição Federal, a não- cumulatividade do ICMS transforma-se em regra jurídica que protege o contribuinte contra investidas do legislador ordinário quanto à vedação do direito ao aproveitamento de créditos gerados no processo ordinário de incidência do tributo.

No entanto, nenhuma ofensa promove contra a Constituição Federal ou a outras normas infraconstitucionais, regras estaduais que, em operações internas, criam regimes especiais com incidências monofásicas do ICMS, isto é, regras que desprezam a técnica da não-cumulatividade, por razões de comodidade arrecadatória e de interesse fiscalizatório.

Os Estados têm a competência constitucional para instituir o ICMS e, dentro dos limites das normas nacionais, estabelecer regras que dizem respeito à sua arrecadação e fiscalização, desde que observadas as garantias constitucionais dos contribuintes e não interfiram na competência dos demais Estados.

Mesmo na ausência de ajuste coletivo dos Estados no âmbito do Confaz, a incidência plurifásica do ICMS, veiculada através da técnica da não- cumulatividade, pode ser relativizada pelos Estados desde que aplicada apenas às operações internas.

Com efeito, nada impede que o Estado, através de regras especiais, centralize o seu poder arrecadatório e fiscalizatório em apenas um contribuinte (caso dos centros de distribuição) no que tange às operações que este praticar dentro deste mesmo Estado ou crie incidências monofásicas para certas mercadorias dentro do seu território.

A rigor, o ICMS já deixou de ser plurifásico desde que o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional a substituição tributária, técnica tributária que concentra a incidência tributária sobre certas mercadorias em apenas um contribuinte da cadeia econômica. Nesta esteira, alguns Estados já criaram incidências monofásicas (via substituição tributária), inclusive à revelia dos demais Estados, nas entradas de certas mercadorias em seus territórios, no que tange às operações internas subsequentes.

A previsão de incidência monofásica também não constitui, por si só, instrumento de incentivo fiscal, porque é técnica instituída no interesse de incrementar a arrecadação e não de dispensar tributo. Os Estados podem legitimamente criar regimes fiscais especiais sob critério objetivo (definindo certas mercadorias) ou subjetivo (caso dos centros de distribuição) definindo incidências monofásicas, com alíquotas específicas, desde que restritas às operações internas aos seus territórios.

Portanto, é perfeitamente constitucional a criação pelos Estados de regras especiais prevendo incidências monofásicas de ICMS, considerando aspectos subjetivos, como os centros de distribuição, ou objetivos, através da definição de certas mercadorias submetidas à tributação única para as operações internas. Tais regras não se confundem com incentivo fiscal até porque emanadas para atender o interesse arrecadatório dos próprios Estados.