Compensação e decadência

Na última terça-feira, a reflexão publicada neste espaço saiu claramente distorcida em função de um deslize do signatário no envio do arquivo eletrônico respectivo, razão pela qual solicito a indulgência daqueles que me honram com a sua atenção hebdomadária pelo equívoco cometido. Exponho a seguir a inteireza do meu pensamento sob o tema em epígrafe.

Os anos noventa caracterizaram-se pelo reconhecimento judicial de uma série de inconstitucionalidades de leis tributárias e o conseqüente direito dos contribuintes a devolução de tributos recolhidos indevidamente.

De maneira louvável, o Poder Público Federal, desde o final do ano de 1991 (Lei 8.383), tomou a iniciativa de editar normas que reconhecem ao contribuinte o direito de compensar valores recolhidos a maior (indébito tributário) com créditos tributários por ele devidos, agilizando, assim, a devolução do que foi arrecadado indevidamente.

Ocorre que a sistemática de compensação tributária foi sofrendo sucessivas alterações, gerando problemas à relação Fisco x contribuinte. Em um primeiro momento (Lei 8.383/91), estabeleceu-se que o contribuinte deveria simplesmente efetuar a compensação nos seus débitos com o Fisco federal, sem necessidade de qualquer formulário especial de informação às autoridades fiscais acerca dos valores envolvidos no procedimento.

O contribuinte deveria extinguir o crédito tributário por ele devido, utilizando como “moeda de pagamento” créditos que teria contra o Fisco federal. Se o Fisco em procedimento de fiscalização detectasse qualquer irregularidade, poderia efetuar lançamento das diferenças apuradas, inclusive acrescidas de penalidades.

Por óbvio, que a sistemática então vigente criava muitas dificuldades à fiscalização, na medida que embora extinto o crédito tributário devido pelo contribuinte mediante o procedimento de compensação, as autoridades não tinham condições objetivas de verificar os números envolvidos neste procedimento, o que poderia acarretar compensações indevidas, em prejuízo do interesse estatal.

Após sucessivas alterações legislativas,  o procedimento de compensação foi melhor sistematizado. Criou-se para o contribuinte a obrigatoriedade de apresentar a declaração de compensação, na qual devem constar informações relativas aos créditos utilizados e aos respectivos débitos compensados e cujo efeito jurídico é de extinguir o crédito tributário com a sua entrega, embora sob condição resolutória, ficando o Fisco federal com o prazo de cinco anos para promover a homologação do procedimento efetuado pelo contribuinte.

Não homologada a compensação, a autoridade administrativa deverá cientificar o sujeito passivo e intimá-lo a efetuar, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da ciência do ato de não-homologação, o pagamento dos débitos indevidamente compensados. O contribuinte poderá recorrer desta decisão apresentando manifestação de inconformidade e posteriormente recurso ao Conselho de Contribuintes.

A grande novidade destas regras está em fixar um prazo, claro e objetivo, de cinco anos, para o Poder Público manifestar-se sobre um pleito administrativo do contribuinte, sob pena de convalidação, pela decadência, do procedimento por este tomado e informado ao Fisco. Passados mais de cinco anos da compensação efetuada pelo contribuinte e informada ao Fisco, não mais poderão aos autoridades fiscais questionar os números envolvidos nos cálculos que instrumentaram a extinção do crédito tributário pela compensação; este direito do Fisco já terá decaído.

A disciplina legal hoje vigente acerca do processo de compensação tributária (Lei 9.430/96, alterada pelas Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03) não deixa dúvidas, ao contrário do que ocorria no regime legal anterior (Lei 8.383/91), de que o Poder Público tem um prazo fatal para concluir a análise da adequação do procedimento de compensação efetuado pelo contribuinte e informado ao Fisco dentro das regras pertinentes. Trata-se de inovação legislativa, ainda não percebida por algumas autoridades fiscais, que inegavelmente opera em favor da segurança jurídica e da necessidade de maior celeridade na análise de pleitos administrativos em matéria tributária.

Portanto, a compensação declarada à Secretaria da Receita Federal extingue o crédito tributário, sob condição resolutória de sua ulterior homologação, a qual pressupõe um processo administrativo que deve ser concluído em cinco anos, contados da entrega da declaração de compensação, momento a partir do qual têm as autoridades fiscais condições de ratificar (homologando) ou não (exigindo) o crédito tributário extinto pelo contribuinte.