O Para e a regulamentação da compensação das exportações

** Texto publicado no jornal O Liberal em  05.01.2017

No final do ano de 2016, o Supremo Tribunal Federal, decidindo ação proposta pelo Estado do Pará, reconheceu a omissão do Congresso Nacional em editar a lei complementar necessária para regulamentar a compensação devida aos Estados exportadores pela desoneração do ICMS antes incidente sobre estas operações.

Foi além o Supremo Tribunal Federal, além de reconhecer a omissão legislativa, estabeleceu o prazo de um ano para que esta omissão seja suprida, mediante a edição da lei complementar exigida pela Constituição Federal. Caso o Congresso Nacional mantenha-se omisso, o Tribunal de Contas da União fica autorizado a estabelecer a compensação devida aos Estados exportadores.

Como se pode observar, o ano de 2017 será um ano de fundamental importância para as finanças dos Estados exportadores, dentre os quais o Estado do Pará, que acumula perdas históricas relevantes com a desoneração tributária das exportações.

Ocorre que a citada regulamentação exigirá importantes decisões no plano parlamentar que terão repercussões no nosso equilíbrio federativo.

Ao tempo em que constitucionalizou a não incidência de ICMS sobre produtos primários e semi- elaborados, antes prevista na Lei Kandir (LC 87/96), a Emenda Constitucional 42/2003 estabeleceu o dever de a União entregar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, o montante definido em lei complementar, de acordo com critérios, prazos e condições nela determinados, podendo considerar as exportações para o exterior de produtos primários e semi-elaborados, a relação entre as exportações e as importações, os créditos decorrentes de aquisições destinadas ao ativo permanente e a efetiva manutenção e aproveitamento do crédito de ICMS.

A regulamentação que deverá ser expedida pelo Congresso Nacional, prevendo um valor de compensação devida aos Estados exportadores, deverá tomar em consideração os quatro critérios já estabelecidos pela Carta Constitucional. Vale dizer, não se trata apenas de verificar quanto o Estado arrecadaria de ICMS, não fosse a desoneração, e compensá-lo integralmente com tal valor, como por vezes surge na grande imprensa. Fosse assim, de nada valeria a regra constitucional com o estabelecimento dos quatro critérios a serem considerados pelo Congresso Nacional ao editar a lei complementar regulamentadora.

Na realidade, ao regulamentar a compensação, primeiramente o Congresso Nacional deverá estabelecer o montante a ser distribuído. Poderá o Congresso simplesmente fixar um valor, previsto orçamentariamente todos os anos, como ocorre atualmente, ou estabelecer um critério legal objetivo, como, por exemplo, o resultado do ICMS desonerado nas exportações, somado aos créditos de ativo permanente utilizados e os valores restituídos aos exportadores, do qual se subtrairia o ICMS incidente sobre as importações.

Em outro dizer, quando do processo parlamentar de regulamentação, antes de se debater como dividir a compensação, o Congresso Nacional deve primeiramente estabelecer o critério do quantum que vai ser compensado aos Estados e Municípios pelo Governo Federal. Este quantum pode ser definido anualmente pelo orçamento, como ocorre atualmente, ou a partir de um critério legal objetivo, de modo que caiba ao Tesouro Nacional simplesmente a tarefa de elaborar o cálculo aritmético do valor a ser distribuído.

Uma vez estabelecido o quantum a ser compensado, cabe a lei complementar regulamentadora prever a forma de distribuição deste valor, o que deve envolver uma ponderação, um sopesamento dos quatro critérios já constitucionalmente previstos, cujo resultado pode melhorar ou até diminuir o valor que alguns Estados já recebem atualmente, daí a atenção que todos devemos ter no peso que o Congresso Nacional vai atribuir a cada um dos critérios constitucionais.

Suponhamos, por exemplo, que o Congresso Nacional resolva atribuir um peso grande ao critério relativo ao aproveitamento dos créditos de ICMS vinculados à aquisição de bens destinados ao ativo permanente. Neste caso, os Estados do centro-sul, mais industrializados, serão extremamente beneficiados, haja vista o parque industrial que abrigam.

O melhor para Estados como o Pará, o Mato Grosso e Goiás, é lutar pela maior ponderação aos critérios do saldo na balança comercial e do volume das exportações de produtos primários e semi-elaborados.

Tais critérios, na realidade, são o que refletem a causa jurídica da própria compensação que se objetiva regulamentar, por duas razões.

Primeira razão, se a compensação veio para fazer justiça aos Estados exportadores de produtos primários e semi-elaborados, que perderam o direito ao ICMS sobre a exportação destas mercadorias desde 1996 com a Lei Kandir, é natural que estes sejam os critérios com maior peso na definição do montante que devem receber a título de compensação.

Segunda razão, a desoneração das exportações teve o objetivo há vinte anos atrás de fortalecer a economia nacional, permitindo a criação de reservas cambiais. Logo, é natural, justo e razoável, que os Estados que geram maiores saldos de balança comercial, transformados em reservas cambiais para o país, recebam o maior volume de compensação pelo seu esforço exportador. Ademais, Estados altamente importadores já cobram ICMS nas operações de importação de mercadorias.

Enfim, a regulamentação da desoneração das exportações a ser veiculada pelo Congresso Nacional poder ser um bom caminho para trazer mais equilíbrio federativo ao Brasil, sobretudo fazendo justiça com os Estados cuja matriz econômica é a exportação de produtos primários e semi-elaborados, setor que vem sustentando a economia nacional na última década. Toda atenção é pouca ao trabalho do Congresso Nacional em 2017.